Ainda
estamos na metade da Olimpíada doRio 2016 e a americana Simone Biles já
conquistou o mundo. Para quem gosta de ginástica artística, seu ouro não foi
uma surpresa. Com 19 anos de idade, ela foi a primeira da história a vencer
três campeonatos mundiais consecutivos em sua modalidade (2013, 2014 e 2015), e
é a ginasta americana mais
condecorada da história em competições internacionais, com 14 medalhas ao todo,
10 delas de ouro.
Biles é
a mais recente de uma série de lendas desse esporte, mas há 40 anos, Nadia Comăneci, da
Romênia, já fazia o que parecia impossível do ponto de vista da física. Ela
tinha apenas 14 anos quando pousou em Montreal, Canadá, para a Olimpíada de
1976, era parte da equipe de ginástica
artística do
pequeno país do leste europeu, e não fazia a menor ideia de que estava prestes
a entrar para a história. Ao terminar uma indescritível prova nas barras
assimétricas, deu uma olhada no painel em que os juízes exibem as notas e viu
um “1.00”. Não era um defeito. Como, até então, não se pensava que fosse possível
atingir a perfeição absoluta na ginástica artística, não era possível exibir os
quatro dígitos de “10.00” na tela. “9.98”? Talvez. Não dez.
Mas não
foi suficiente realizar a façanha uma vez. Comăneci conquistou outras seisnotas dez ao
longo evento, com um grau de confiança e precisão que jamais foi superado.
Assistir à compilação de notas imbatíveis é como ver uma animação de
computador. Veja abaixo.
os anos
seguintes, o “10.00”, claro, não virou rotina. Mas foi alcançado por número
razoável de atletas até sua extinção, em 2006, quando
entrou em vigor outro – e muito criticado – sistema de pontuação.
Comăneci
e Biles parecem desafiar as leis
da física todos os
dias. É difícil observar o movimento de seus corpos e não se lembrar da
associação das Olimpíadas da antiguidade com os deuses. Não há nada
inexplicável ali, porém: é tudo ciência.
Biles é
sinônimo de um movimento específico: o mortal duplo estendido com um meio
giro.
O
mortal é um salto em que os dois pés passam por cima da cabeça e voltam à
posição original. Ele possui variações. Uma delas, o carpado, entrou para
imaginário brasileiro por ser característica da ginasta Daiane do Santos.
Nele, a acrobacia é feita com o corpo dobrado em um ângulo menor que 90° e as pernas esticadas. Outra, ainda
mais difícil, é a estendida,
em que o corpo simplesmente não é dobrado.
Esse
detalhe é importante: quando uma atleta encolhe o corpo na hora do salto, ele
fica muito mais fácil. Por quê?
N a física,
há uma unidade de medida chamada inércia
rotacional. Ela mede a resistência de um corpo às alterações na
sua rotação. Parece difícil de entender, mas na verdade é bem simples. Quando
um corpo está girando, ele gira em torno de um eixo. Quanto mais distante do
eixo estiver a massa desse corpo, mais ele vai resistir ao giro.
Um objeto
como um machado, por exemplo, possuí muita massa em apenas uma ponta, afinal, o
cabo é muito mais leve que a lâmina. Já a massa de um livro é distribuída de maneira
mais ou menos uniforme. O ser humano possuí uma característica notável: ele
pode se encolher ou se esticar, alterando a posição de suas pernas e braços sem
tirar o tronco do lugar. Se você abraçar seus joelhos e se tornar uma
“bolinha”, você ocupará menos espaço, mas continuará pesando os mesmos 70 ou 80
quilos.
Ou
seja: quem salta com o corpo encolhido mantém a própria massa próxima ao eixo de rotação. Isso diminui a inércia,
ou seja, a vontade que seu corpo tem de ficar ali paradinho em vez de dar a
pirueta. Quem salta com o corpo esticado, por outro lado, joga toda a massa
para as pontas, bem longe do eixo, o que aumenta a força que atua contra o giro.
E é aí
que reside a grande dificuldade do salto. Considere que ele é duplo, ou seja,
são dois giros, e que no final ainda há o meio giro, que demandaria mais alguns
parágrafos de explicação, e é provável que você saia dessa matéria mais animado
para fazer uma graduação em física que para tentar a carreira olímpica.
O
Laboratório de Biofísica da Escola de Educação Física e Esporte (EFEE) da USP,
mediu e analisou cada centímetro de um salto de Daiane dos Santos e ainda fez o GIF abaixo.
Como,
então, Biles faz para se manter esticada durante o giro?
Em
primeiro lugar, ela é forte. Muito forte. Tanto que ela é capaz de pular duas
vezes sua própria altura. O que a permite, mesmo com a perda de estabilidade
decorrente do salto
estendido, manter a coluna reta de um jeito que daria inveja a
qualquer ortopedista.
Outra
parte importante do truque é dar um jeito de mudar a distribuição de massa docorpo com pequenos ajustes sem encolher as
pernas. Ela começa o salto com os braços esticados para o alto, mas eles se reúnem
e voltam à posição normal ao longo do giro.
A
última parte, claro, é ter nascido sendo Simone Biles. Ou Daiane dos Santos. Ou
Nadia Comăneci.
Para
terminar ajudando a animar seu dia no escritório, você pode checar o efeito sem
sequer se levantar da cadeira. Estique seus membros e gire em torno de seu
próprio eixo. Depois faça a mesma coisa abraçando os joelhos. Se tudo der
certo, você irá girar mais rápido na segunda tentativa
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